Texto escrito por Marcelo Alves Cavalcante, Cristiano Rennó Sommer e Gustavo Braga Esteves[i]
Considerando os impactos econômicos causados pelas medidas de contenção e prevenção do CORONA Vírus, começa a circular a questão sobre a possibilidade do adiamento do pagamento de Tributos Federais.
Diversas teses jurídicas, objetivando o adiamento do pagamento de tributos, surgiram para buscar preservar o caixa de empresas que tiveram suas atividades suspensas, bem como daquelas que, por via indireta, tiveram (ou ainda terão) significativa redução de sua capacidade produtiva em decorrência dos impactos econômicos ocasionadas pelo confinamento coletivo.
As principais teses apresentadas por contribuintes, via Mandando de Segurança, tem por base a Portaria 12/2012 do Ministério da Fazenda, o Princípio da Razoabilidade e a Teoria do Fato do Príncipe, sendo que, cada uma dessas teses tem prós e contras que devem ser considerados.
Quanto à portaria 12/2012 do MF, esta dispõe que, nos Estados em que houver decretado situação de calamidade pública, os prazos para o recolhimento dos tributos federais serão adiados para o último dia útil do 3º mês subsequente ao decreto.
Desta forma, utilizando o Estado de Minas Gerais como paradigma, temos o Decreto 47.891/2020, que reconhece o Estado de Calamidade Público por ocasião do COVID-19. Assim sendo, por uma analogia ao referido decreto, poderá ser considerado que há direito líquido e certo do Contribuinte para prorrogação do prazo de recolhimento dos Tributos Federais.
Os pontos a favor da presente tese é que, independentemente da LC n°101/2000 não vedar o adiamento de pagamento de tributos, ainda que careça de regulamentação, o direito do contribuinte ali está estabelecido. Portanto, a portaria seria válida. O Contribuinte não pode sofrer prejuízo pela inércia da administração pública.
Exemplo disso foi a decisão proferida pela Justiça Federal de São Paulo, n Mandado de Segurança nº 5004087-09.2020.4.03.610, que concedeu a liminar com base na referida portaria nº 12, entendendo que “a norma do art. 1º da Portaria MF referida é clara a respeito da prorrogação de prazo para recolhimento dos tributos, na presente situação” e que “embora a Portaria em questão não mencione calamidade pública nacional, não me parece, nesta abordagem inicial do processo, que a abrangência maior do motivo da decretação estadual seja impeditivo para a incidência da norma tributária.
No que se refere ao Princípio da Razoabilidade, que tem como base os princípios Constitucionais da Garantia do Emprego, Função Social da Empresa, Dignidade da Pessoa e outros, já se apresenta como uma tese de caráter mais atrelado às técnicas de interpretação jurídica (hermenêutica).
Dentro desse espectro, há que ser perguntado se é razoável fechar uma empresa porque não pode pagar tributos? Ou ainda, se é razoável que uma empresa demita funcionários para poder pagar tributos? Ou mesmo, se seria razoável que se endivide contribuinte, impedido de exercer sua atividade, para pagar tributos?
Em que pese a fundamentação de alguns Mandados de Segurança entenderem que isso dar-se-ía como se fosse uma espécie de moratória e que, como tal, apenas poderia ser implementada por lei, entendemos que não se trataria de moratória, haja visto que, prorrogar prazo de pagamento não configuraria moratória, mas sim diferimento, que são institutos diversos e não se confundem. Neste sentir, a prorrogação de prazo, fixação de data de pagamento de tributo, podem ser dispostos por qualquer meio de legislação tributária, incluindo portaria.
Tal tese foi bem sucedida no Mandado de Segurança nº 1016660-71.2020.4.01.3400, impetrado perante a Justiça Federal do Distrito Federal que concedeu a segurança para a prorrogação do vencimento dos tributos federais por 3 meses.
Na decisão, aquele Magistrado utilizou como fundamentos os princípios supracitados, encontrados nos arts. 1º, III e V; 3º, III; 5º, XXIII; 6º, 7º, I e 170, III e VIII; todos da Constituição Federal.
Observa-se que, em tal decisão, houve uma preocupação de caráter social que deixou implícito que a empresa não deve demitir funcionários.
Por fim, outra tese que ampara a pretensão de adiamento da exigibilidade de tributos federais, tem por base a Teoria do Fato do Príncipe, onde se reconhece a possibilidade “precária e temporária de se priorizar a manutenção dos postos de trabalho e custeio mínimo de sua atividade existencial em detrimento do imediato recolhimento das exações tributárias, sem que isso lhe acarrete as punições reservadas aos contribuintes que, em situação de normalidade, deixam de cumprir a legislação de regência”.
Via de regra, o Fato do Príncipe é aplicável apenas em relação contratual, sendo que, a relação jurídico tributária não tem caráter contratual e, desta forma, tal alegação tem sido feita com base interpretativa analógica.
O cenário apresentado atualmente não encontra parâmetros anteriores para balizar as situações atualmente vividas, assim, as teses suscitadas para diferimento do pagamento dos tributos federais podem ser vitoriosas junto ao judiciário. Porém, não há uniformidade de entendimento até o momento.
Marcelo Alves Cavalcante, Graduado em Direito pela Universidade de Itaúna; Pós-graduado em Direito Tributário pela PUC-MG; Programa de Desenvolvimento de Dirigentes PAEX – FDC; Mestrando em Direito Empresarial – Faculdade Milton Campos; membro do Comitê de Gestão de Escritórios da AMCHAM. Cristiano Rennó Sommer, Graduado em Direito pela Faculdade de Direito Milton Campos; Pós-graduado em Administração do Comércio Exterior pela UNA - União de Negócios e Administração; Mestre em Direito Empresarial pela Faculdade de Direito Milton Campos; Mestre em Direito Comunitário e Internacional pela Saarbrücken Universität - Europa Institut; Doutorando em Direito Econômico pela UFMG; Professor de Direito da FUMEC FCH e FACE Gustavo Braga Esteves, Graduado em Direito pela PUC-MG; Graduando em Ciências Contábeis pela PUC-MG; Pós-Graduado MBA em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas (FGV-Rio).
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